História de Santa Cristina do Pinhal: Família Baptista e sua contribuição para a comunidade – Parte I
Muito antes de Parobé existir como cidade autônoma, Santa Cristina do Pinhal já era um núcleo pulsante no coração da região. Seu passado, por muito tempo abafado pelo esquecimento administrativo, revela uma comunidade rica em cultura, religiosidade, comércio e luta política. A trajetória desse território, que hoje pertence ao município de Parobé, remonta ao século XIX, quando os primeiros colonizadores — açorianos, luso-brasileiros e, mais tarde, imigrantes alemães, italianos e de outras etnias — ocuparam a região às margens do Rio dos Sinos.
O local, inicialmente conhecido como Pinhal, foi elevado à categoria de Capela Curada em 1847, passando a se chamar Santa Cristina do Pinhal e tornando-se distrito de São Leopoldo. Com o tempo, consolidou-se como entreposto comercial graças ao seu porto fluvial, por onde circulavam farinha de mandioca, cachaça, madeira e outros produtos da região. Em 1880, foi finalmente elevado à categoria de vila e sede de município pela Lei Provincial nº 1.251, tornando-se politicamente independente, com jurisdição sobre áreas que hoje integram Parobé, Taquara e São Francisco de Paula.
Contudo, os ciclos políticos e econômicos não favoreceram sua permanência como município. A ascensão de Taquara do Mundo Novo, com sua economia em expansão e maior representatividade política, enfraqueceu Santa Cristina. Em 1892, por meio do Ato nº 301, o município foi extinto e seu território anexado a Taquara.
Mesmo sem status municipal, Santa Cristina manteve sua importância como centro comercial até meados do século XX. As gasolinas, embarcações que navegavam o Rio dos Sinos, continuaram escoando a produção local até a década de 1950, quando a construção de rodovias e o assoreamento do rio inviabilizaram a navegação. A economia local passou a depender da produção leiteira, das olarias e da extração de pedra.
Em 1982, após o plebiscito e emancipação de Parobé, Santa Cristina deixou de ser distrito de Taquara e passou a integrar o recém-criado município de Parobé. Ainda hoje, a localidade guarda marcos do passado, como a antiga Praça da Igreja Matriz, e um sentimento profundo de identidade entre seus moradores, muitos dos quais descendem das famílias que ajudaram a erguer o Pinhal – entre elas, os Baptista, Moraes, Schirmer, Santos e tantas outras.
Quem está na foto?
Antes de mais nada, vamos identificar quem está na foto. Segundo informações de Marialdo da Silva Schirmer, na foto, sentada, está Maria Amélia Vieira (1866–1920), a matriarca da família Baptista, casada com José de Souza Baptista (1860–1930). Junto com ela estão seus filhos, da esquerda para a direita:
Bernardina Vieira Baptista – avó de Marialdo da Silva Schirmer.
Normélio de Souza Baptista – comerciante e proprietário de embarcações.
Júnia Vieira Baptista – casada com Theodolindo Alves dos Santos, foi responsável pela Central Telefônica e pelos Correios locais.
Christiana Vieira Baptista – casada com Osório Schirmer, participou ativamente da vida comunitária.
A história da família Baptista:
As águas do Rio dos Sinos que cortam Santa Cristina do Pinhal já não ecoam o barulho das gasolinas, mas permanecem como testemunhas silenciosas da história de famílias que marcaram o desenvolvimento da região. Entre elas, a dos Baptista — herdeiros da matriarca Maria Amélia Vieira, casada com José de Souza Baptista — que fincou suas raízes no solo fértil e na vida comunitária que floresceu nas margens desse rio. O casal se casou em 22 de abril de 1883.
Na foto, estão quatro de seus filhos: Bernardina Vieira Baptista (casada com Leopoldo Ignacio da Silva), Normélio de Souza Baptista (casado com Emília Alano), Júnia Vieira Baptista (casada com Theodolindo Alves dos Santos) e Christiana Vieira Baptista (casada com Osório Schirmer). Cada um, à sua maneira, atuou na formação do que hoje conhecemos como o distrito de Santa Cristina do Pinhal. A foto foi tirada no início do século passado.
Normélio Baptista e a economia fluvial:
Normélio de Souza Baptista (1889–1955) foi um dos nomes mais fortes na história da navegação local. Dono das embarcações Não Tem Rival e Santo Antônio, ele foi figura central no transporte de mercadorias entre Santa Cristina e Porto Alegre, especialmente nas décadas de 1930 e 1940. Seu filho, José Álvaro Baptista, falou sobre seu pai para Angelita Vargas Peixoto em “Santa Cristina do Pinhal: Memórias de um Município Extinto”: “Toda a vida o meu pai, Normélio de Souza Baptista, foi embarcado nesses barcos, transportando lenha, mercadorias, feijão, milho, farinha de mandioca. A vida dele foi essa. Depois, por volta de 1930, ele comprou um sítio”.
A memória de Normélio também aparece nas falas de Sueli Estela dos Santos, sobrinha e moradora de Santa Cristina: “Tinha as gasolinas “Taquar”a, “Não Tem Rival”, “São José”, “Martha” e o barco do Belmiro Fauth. Era o seu Belmiro, o Normélio, o seu Neco Manique e o Chico Moreira”.
Júnia Baptista e a comunicação da comunidade:
Irmã de Normélio, Júnia Vieira Baptista dos Santos (1885-sem data) foi peça-chave na comunicação local. Em uma época em que os meios eram escassos, a central telefônica e o posto dos correios funcionavam dentro de sua casa. Sua filha, Noeli Adelaide dos Santos do Amaral, contou à Peixoto: “Minha mãe era quem cuidava da Central Telefônica e nós ajudávamos. Só os telegramas e fonogramas que só passavam por ela”. Noeli ainda reforça o papel de Normélio no comércio: “Tio Normélio era irmão de minha mãe, a Júnia Baptista dos Santos; e o meu pai, Theodolino Alves dos Santos […] Ele tinha a Não Tem Rival”
Theodolino Alves dos Santos: comerciante e produtor
Theodolino (1883–1966), marido de Júnia, também é citado por diversos entrevistados para a obra de Angelita Vargas Peixoto como um dos empreendedores locais, envolvido com olaria, criação de gado, produção de telhas e transporte de lenha. Sueli Estela dos Santos, filha de Theodolino, menciona: “O papai carregou muita lenha para Porto Alegre de barco. Ele tinha olaria e carregava telhas também no barco do tio Normélio”.
Christiana Baptista Schirmer e a memória institucional:
Outra filha do casal José e Maria Amélia, Christiana Vieira Baptista (1887-sem data), casou-se com Osório Hemogenio Schirmer (1887–1955), também conhecido por sua atuação na comunidade. O neto do casal, Silvio Quintino de Mello, lembra: “Meus avós maternos são Osório Hemogenio Schirmer e Cristiana Baptista Schirmer. […] Ele foi juiz de paz e fazia parte da Cooperativa. Também funcionava a Subprefeitura e um Cartório na nossa casa”. Além disso, há o registro da existência de um poço artesiano e uma bomba de água da antiga CORLAC instalada no terreno que pertencia a Osório.
Ligações familiares:
José de Souza Baptista, o patriarca da família, era primo oitavo do meu bisavô Irineu Ferreira Leite Sobrinho (1878–1923), casado com Natália Gonçalves Moreira (1889–sem data), cujo casamento foi realizado em 29 de abril de 1908 em Ponche Verde, Dom Pedrito. Reza a lenda que Irineu foi degolado na Revolução de 1923. Até o momento não localizei a certidão de falecimento dele, e conto apenas com história oral da família. Por ser uma região de fronteira com o Uruguai, sempre foi um local com muitos conflitos, o que levou minha bisavó Natália a se mudar com os filhos, dentre eles meu avô Jacy Moreira Leite (1917–1980), para a cidade de Butiá.
Aliás, vale a pena abrir um trechinho do texto para contextualizar o acontecimento: a Revolução de 1923 foi um conflito civil entre os chimangos, apoiadores do então presidente estadual Borges de Medeiros, e os maragatos, liderados por Assis Brasil, que contestavam fraudes eleitorais e o autoritarismo do governo. A guerra durou quase um ano e ficou marcada pelas degolas, prática violenta usada por ambos os lados contra prisioneiros, o que lhe rendeu o nome popular de “revolução da degola”. Entre os principais palcos da revolta estava Dom Pedrito, importante reduto maragato na região da Campanha Gaúcha. Ali se localiza Ponche Verde, lugar historicamente simbólico por ter sido, quase 80 anos antes, o cenário da assinatura do tratado que encerrou a Revolução Farroupilha (1845). Em 1923, Ponche Verde voltou a representar a busca por paz, com o Pacto de Pedras Altas, que encerrou a guerra e pôs fim às reeleições consecutivas no estado. Assim, Ponche Verde carrega duplo valor histórico: como ponto final de dois dos mais marcantes conflitos da história gaúcha.
Tal ligação familiar vem do meu avô da 11º geração, o açoriano Pedro Sarmento (1621–1673), casado com Barbara Andre (1621-sem data). É provável que o casal tenha residido em Pedro Miguel, uma freguesia portuguesa do município da Horta, na Ilha do Faial. Dentre outras ligações em comum temos antepassados das famílias Martins, Fialho e muito mais.
Desta forma, Marialdo da Silva Schirmer é meu primo 11º, enquanto Silvio Quintino de Mello é meu primo 14º, através de outra linhagem da família, cujas origens são muito interessantes, como veremos a seguir.
Jorge Velho, ligação africana:
A ligação com Silvio Quintino de Mello vem através dos meus avôs da 14º geração, Jorge Velho (1450–sem data) e África Annes (1451–1481). Jorge Velho era, segundo Gaspar Frutuoso, sobrinho de um rei de Fez (provavelmente Abd-el-Hakk II), pertencente à dinastia merínida, com domínio em áreas que hoje correspondem ao Marrocos e Argélia. Era descendente direto do sultão Abu Said Uthman III.
Por volta da época dos descobrimentos portugueses, Jorge Velho foi a Portugal, onde foi recebido pelo Infante Dom Henrique. Influenciado por ele, converteu-se da religião muçulmana ao cristianismo. Seu padrinho de batismo foi Gonçalo Velho, comendador de Almourol, de quem Jorge adotou o sobrenome “Velho”. Jorge Velho foi um dos primeiros povoadores dos Açores, fixando-se inicialmente na ilha de Santa Maria e depois em São Miguel. Lá, esteve envolvido na introdução de gado e no povoamento.
Casou-se com África Annes (ou Áfricanes), mulher de origem também ligada ao norte da África, embora sua origem exata tenha diferentes versões nas fontes. Teve três filhos: João Jorge (meu avô da 13º geração), Pero Jorge e Fernão Jorge. A partir deles, Jorge Velho deu origem a diversas famílias importantes nos Açores, especialmente em Santa Maria e São Miguel. Entre seus descendentes destacam-se cavaleiros, religiosos, administradores e povoadores que participaram de conquistas e povoamentos nas ilhas, na África e até nas Índias.
Jorge Velho é hoje considerado ancestral de milhares de brasileiros, por meio de suas várias gerações de descendentes açorianos que migraram posteriormente para o Brasil. Ele também simboliza um exemplo raro de integração entre um membro da antiga nobreza muçulmana do norte da África e a nobreza de serviço portuguesa, além de representar um dos muitos elos genealógicos entre Portugal, os Açores e o Brasil.
Créditos da foto:
Acervo de Silvio Quintino de Mello/Marialdo da Silva Schirmer
Fontes:
FAMILYSEARCH. Perfil da pessoa: 9J1M-V9L. Disponível em: https://www.familysearch.org/pt/tree/person/details/9J1M-V9L. Acesso em: 16 jun. 2025.
FRUTUOSO, Gaspar. Saudades da Terra. Livro III. Lisboa: Instituto Cultural de Ponta Delgada / Secretaria Regional da Educação e Cultura, 1978.
GENEARC. Jorge Velho: Detalhe de pessoa. Disponível em: https://www.genearc.net/index.php?id=MTAxMzM%3D&op=ZGV0YWxoZVBlc3NvYS5waHA%3D. Acesso em: 14 jun. 2025.
PEIXOTO, Angelita Vargas. Santa Cristina do Pinhal: Memórias de um Município Extinto. Parobé, 2024. Secretaria de Estado da Cultura do RS.
SCHIRMER, Marialdo. Descendentes de Georg Schirmer- Arquivo em PDF.
VELHO, Jorge. De Jorge Velho, antigo povoador da Ilha de S. Miguel, e dos Jorges seus descendentes. Almanaque Açoriano, [s.d.]. Disponível em: http://www.almanaqueacoriano.com/index.php/utilidades/biblioteca-total/saudades-da-terra/67-saudades-da-terra/3053-de-jorge-velho-antigo-povoador-da-ilha-de-s-miguel-e-dos-jorges-seus-descendentes. Acesso em: 15 jun. 2025.
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