Um perfil de Nestor Herculano de Paula, da Calçados Azaleia

19 de dezembro de 202519 de dezembro de 2025Maicon Leite 0 comentáriosCalçados Azaleia, Nestor Herculano de Paula

No texto de hoje – o início de um novo especial – vamos buscar conhecer um pouco da história de Nestor Herculano de Paula, um dos fundadores da Calçados Azaleia. Na verdade, como é um assunto extenso e complexo, ao longo da existência do projeto serão publicadas matérias especiais sobre este visionário do mundo dos calçados.

A foto, clicada por Jerri Rossato em um evento realizado em junho de 1996, eterniza um importante momento. Naquele ano, a Azaleia vivia seu momento de maior expansão física e econômica no Rio Grande do Sul, antes da migração massiva de parte da produção para o Nordeste (que se intensificaria a partir de 1997/98). Nestor não era apenas um executivo de escritório; ele era conhecido por estar sempre presente, falando diretamente com as pessoas.

Nos vales do Paranhana e do Sinos, onde o barulho das prensas de calçados dita o ritmo da economia, poucas figuras alcançaram a estatura mítica de Nestor Herculano de Paula. Falecido no dia 23 de janeiro de 2004, Nestor não foi apenas um dos responsáveis em transformar uma pequena fabriqueta – localizada atrás do prédio do Cine Central – na gigante Calçados Azaleia; ele foi o arquiteto de um modelo de gestão que, décadas antes do termo ESG virar moda, já colocava o social no centro da estratégia corporativa.

A trajetória de Nestor é o arquétipo da “jornada do herói” industrial. Nascido em 1937 em Novo Hamburgo, sua vida começou marcada pela escassez. Filho de João de Paula, Nestor e seu irmão, Arnaldo Luiz de Paula, enfrentaram a orfandade precoce. A perda dos pais (a mãe aos 7 anos, o pai aos 9) forjou nos irmãos “de Paula” uma resiliência férrea.

Enquanto muitos teriam sucumbido às estatísticas, Nestor começou como cobrador de ônibus e vendedor, absorvendo as ruas e o comércio. Essa vivência foi crucial quando, em 2 de dezembro de 1958, aos 21 anos, uniu-se ao irmão Arnaldo e aos sócios Theno José Berlitz, Nelson e Arlindo Lauck (cunhados de Theno) para fundar o que viria a ser a Azaleia. A produção inicial? Dez pares por dia. O destino? Tornar-se a maior fabricante de calçados da América Latina.

No mesmo ano do surgimento da Berlitz, Lauck & Cia¸ Nestor já era noivo de Diva de Paula, uma companheira de vida que também era braço direito no trabalho, trabalhando na produção dos calçados e na parte administrativa. Nestor e Diva tiveram três filhos. É de se salientar que as esposas de todos os sócios trabalhavam na fábrica, sendo figuras fundamentais para seu desenvolvimento.

“Tem Gente Atrás da Máquina”

O diferencial analítico da gestão de Nestor não estava apenas nas prensas modernas ou na ousadia de lançar a marca Olympikus em 1975 para brigar com gigantes estrangeiros. O segredo estava em sua filosofia: “A empresa só cresce se seus funcionários crescerem junto”.

Ao contrário do industrial padrão dos anos 80 e 90, focado apenas em volume e exportação, Nestor olhava para dentro. Em 1991, ao perceber que havia uma parcela de funcionários que viviam de forma precária, lançou o projeto “Construindo o Futuro”. Não era caridade, era estratégia de longo prazo. A Azaleia passou a construir casas, creches e escolas.

A lógica era simples e revolucionária: um funcionário que tem onde morar e onde deixar os filhos trabalha melhor. Em tempos de hiperinflação, Nestor chegava a antecipar aumentos salariais alegando que “o gás tinha subido”. Ele entendia a economia doméstica de seus operários porque, um dia, ele esteve no lugar deles.

A partida de Nestor, em janeiro de 2004, representou mais do que a perda de um líder; marcou o encerramento de um ciclo único na indústria calçadista nacional. Embora a configuração da empresa tenha mudado nos anos seguintes — culminando na integração ao grupo Vulcabras —, a marca deixada pelo “Seu Nestor” na memória de Parobé e região é indelével.

Seja no nome que hoje batiza a rodovia ERS-239, na EMEF Nestor Herculano de Paula — localizada no bairro Residencial Azaleia —, no Instituto que preserva seus valores ou nas lembranças das famílias que pela empresa passaram, seu legado e sua grande lição permanece viva: a verdadeira riqueza de uma indústria não se mede apenas em pares produzidos, mas na dignidade de quem os produz.

Crédito da foto:

Foto de Jerri Rossato – Acervo de Roseli Santos / Acervo do Laboratório de Ensino de História e Acervo de História Regional da FACCAT

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